quinta-feira, 18 de julho de 2013

Um novo meio para pensar soluções de forma coletiva

Post-its e canetas coloridas transbordam em uma cesta no canto da sala. De pé, já munidos do material, representantes de uma grande consultoria internacional e profissionais da empresa cliente anotam observações e impressões em palavras isoladas ou frases curtas. O objetivo é reformular um antigo projeto. Com as metas e expectativas definidas em uma lousa, tudo lembra uma grande discussão de relacionamento. Aos poucos, os participantes colam os papéis em um painel que cobre toda a parede, dividido por temas: o que funciona, o que precisa mudar ou deve permanecer.

Esta é apenas uma das etapas de um processo já bastante conhecido em agências de publicidade e consultorias de gerenciamento de marca, mas que começa a ganhar força também nas salas de reunião de empresas dos mais diversos setores: o "design thinking".

Trata-se de uma abordagem multidisciplinar e colaborativa para desenvolver produtos, projetos ou solucionar problemas complexos. Desse modo, forma-se um "time de inovação" para discutir diferentes opiniões, fazer pesquisas de campo e testar protótipos, sempre com foco no ser humano por trás do consumidor.

De acordo com Ricardo Ruffo, especialista no assunto, um dos primeiros passos é colocar os holofotes nas divergências. Isso serve para desconstruir, compreender e redefinir o problema. Depois, vem a fase de convergência, na qual todas as informações levantadas são direcionadas para um ponto de vista coletivo. "Dependendo da abordagem, o 'design thinking' pode ser aplicado em inúmeras ocasiões. Embora a estética seja um elemento importante no processo, é preciso entender o termo em inglês como o 'pensamento por trás de um projeto'", afirma.

Formado em administração de empresas, Ruffo teve o primeiro contato com a ferramenta em workshops e cursos rápidos quando foi estudar nos Estados Unidos, em 2009. Depois, buscou se especializar em um programa específico na Alemanha e ganhou experiência abrindo sua própria consultoria de inovação, a Design Echos.

Atualmente, ele está à frente da Escola Design Thinking, que ensina a metodologia em cursos abertos de quatro meses, que totalizam 160 horas. A primeira turma começou há poucas semanas com 28 pessoas. A classe é diversificada e engloba desde jovens empreendedores de 20 anos de idade até executivos seniores em transição de carreira que estão na casa dos 60.

Um dos alunos é Gabriel Eiras Villa, gerente de planejamento de novos negócios da Bradesco Cartões. Também administrador de empresas, ele conheceu o "design thinking" por meio de uma consultoria externa. "Achei a ideia muito interessante, mas senti que estava dissociada do mundo corporativo e das necessidades da companhia", diz.

Villa, então, procurou o curso com o objetivo de se tornar o condutor do processo em sua equipe. "O 'design thinking' ajuda a vislumbrar os resultados de forma mais eficiente, sem alterações no meio do caminho, que geralmente não são simples e custam muito", explica.

Embora já conhecesse boa parte da teoria - existe uma vasta bibliografia disponível sobre o assunto -, o executivo ressalta que as aulas práticas são fundamentais para aperfeiçoar habilidades como envolver e interagir com as pessoas da maneira correta, ter a disciplina de não pular etapas e manter o foco ao lidar com times multifuncionais.

Na escola de educação executiva B.I. International, o "design thinking" é tratado em cursos como o master de empreendedorismo e inovação e em semanas de imersão específicas sobre o assunto, tanto no Brasil quanto em instituições parceiras nos Estados Unidos e na China. "Quando alguma ideia é tecida com a participação de todos, ela já nasce aprovada. Isso significa economizar tempo e dinheiro", afirma Anna Maria Guimarães, coordenadora na escola.

De acordo com ela, as redes sociais têm facilitado o uso desse modelo, pois permitem debater e testar ideias, além de colher opiniões do público, de forma quase imediata. Além disso, é possível usar essas plataformas na chamada cocriação de produtos. "Essa responsabilidade não precisa ser exclusiva da área de pesquisa e desenvolvimento de uma companhia, mas pode contar com parceiros do mundo todo", diz.

Um exemplo bem-sucedido, em sua opinião, foi o lançamento do carro Novo Uno, da Fiat, que ganhou formas e cores um tanto quanto inusitadas para os padrões do mercado. Segundo Anna Maria, a maioria dos alunos que busca esses cursos é de profissionais que querem aprender novas técnicas para se manterem atualizados e competitivos. "É dever das escolas de negócios disseminar o 'design thinking'."

Formada em arquitetura, Nicole Unger começou a ler e a estudar a respeito quando trabalhou em uma consultoria de inovação que aplicava a ferramenta. Hoje, sócia da Eólica, que atua na área de marcas e design, ela afirma que muitas pessoas ainda estranham a abordagem, muito diferente de uma consultoria tradicional de negócios. "Aplico o 'design thinking', mas não vendo necessariamente o termo", diz.

Nicole está na fase final de uma especialização de gestão empreendedora e afirma que a metodologia pode ser usada em situações diversas do mundo corporativo, como para mudar a cultura de uma empresa, tornando-a mais inovadora. "O foco sempre deve estar nas pessoas e nas suas necessidades. Desse modo, chegamos a soluções compatíveis com as possibilidades técnicas do cliente", afirma.

Especialista no assunto, o publicitário Rodrigo Conde vê de forma positiva profissionais de outras áreas, como a de recursos humanos, estudarem e aplicarem o "design thinking" fora do universo para o qual foi originalmente criado. Sócio da The Led Project, empresa que atua no segmento de marcas e produtos, ele afirma que existem técnicas comuns, mas que a aplicação pode ser personalizada de acordo com a demanda e a realidade da companhia. "Não se trata de algo linear. Se um diretor de RH criar as conexões e buscar os significados corretos, o processo pode ser muito enriquecedor", diz.

Conde enfatiza, contudo, a importância de se manter a essência da ferramenta, sem descuidar da investigação, da criação de cenários, da validação de hipóteses e da captura de "insights". "Esse executivo pode difundir o modelo internamente em sua organização e montar times híbridos de inovação envolvendo pessoas de diferentes hierarquias e setores."

Para Ronald Kapaz, sócio-diretor da consultoria OZ Estrategia+Design, esse interesse do mundo corporativo pelo "design thinking" é saudável, mas deve ser visto com ressalvas. Em sua opinião, para que ele seja realmente eficiente é preciso que os gestores não tentem pensar como designers, mas sim enxergar o mundo como eles. Caso contrário, até poderão aprender a metodologia, mas não vão conseguir os resultados inovadores que tanto desejam.

"Os empresários perceberam que essa prática é usada com bastante sucesso na busca por soluções criativas. Há, porém, uma supervalorização da racionalidade por parte deles. O foco não deve ser o 'thinking' dos designers, mas o 'feeling'", afirma. Desse modo, ele enfatiza que é essencial usar os dois hemisférios do cérebro para aliar objetividade, sensibilidade e estética. O problema, segundo ele, é que, geralmente, os executivos não têm um repertório artístico e cultural que os permita compreender de forma mais profunda o que foi idealizado. "Falta uma educação voltada pra isso", afirma.

Kapaz, porém, admite que a tentativa de adaptar a ferramenta para solucionar problemas atuais de gestão de forma mais dinâmica e criativa é um bom começo, ainda que se trate de uma "tradução simplificada de um processo bastante complexo". Ricardo Ruffo, da Escola Design Thinking, concorda: "Não é apenas uma sessão de 'brainstorm' incrementada, nem simplesmente colar post-its na parede."

Fonte: Jornal VALOR ECONÔMICO 22maio13

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